Aprendizagem dos cães: uso de recursos sensoriais e cognitivos

Profa. Dra. Ceres Berger Faraco – Especialista em Comportamento Animal 

 

Segundo a maior parte daqueles que incluem os cães em suas famílias, o que torna esses inicialmente atraentes e contribui para constituir vínculo é quando procuram aproximação com as pessoas, interagem e as saúdam afetuosamente. Porém, alguns exibem comportamentos de medo, evitam o contato, se encolhem, tremem ou até mesmo mostram sinais de ameaça e possível mordedura. Estas manifestações podem permanecer na convivência com os tutores.

Prioritariamente, para estes casos há necessidade de ajuda visando modificar o comportamento por meio de aprendizagem. Técnicas comuns de treinamento direcionadas aos cães medrosos incluem habituação, condicionamento operante e dessensibilização com contracondicionamento. Além dessas, com frequência, são recomendadas medicações para complementar os programas de ensino e facilitar a operacionalização dos treinos e aprendizado. 

Outros métodos que se utilizam de sons, aromas e feromônios sintéticos são integrados aos protocolos e indicados para reduzir o medo, acalmar os cães e promover aprendizagem. São instrumentos do que pode se denominar de educação sensorial para alcançar uma infinidade de habilidades usando os recursos naturais da espécie. 

É importante observar que essas abordagens se concentram principalmente na redução do medo como primeiro objetivo. Porém, a redução de medo não leva necessariamente a um aumento de comportamentos amistosos e sensíveis para aprendizados. Portanto, estes procedimentos constituem os primeiros passos de qualquer programa para aquisição de novas experiências positivas.

Uma base para o desenvolvimento de programas para treinamento ou adestramento é oferecida pelos princípios de Psicologia da Aprendizagem aplicada aos cães. A partir destes fundamentos, fica clara a importância de compreender como a mente canina funciona, como eles percebem e classificam os estímulos do ambiente no qual estão inseridos e qual sua resposta a eles. Estes princípios que regem a aprendizagem são definidores das diferenças no tempo necessário para ensinar um cão, na escolha de técnicas a serem utilizadas e na qualidade final de resultados obtida por estes métodos.

Sabe-se que os cães reconhecem, classificam, organizam e categorizam as informações que recebem através dos sentidos. Este processo ocorre desde o momento em que são capazes de extrair informações sensoriais do seu entorno e de estabelecer relações entre os estímulos que recebem. Essas conexões são armazenadas na memória para serem resgatadas quando necessário.

A retenção de informações no cérebro permite que o cão possa responder a um novo estímulo em décimos de segundo. É o tempo real necessário para responder ao inesperado de forma eficaz e com a estratégia de comportamento apropriada. Neste sentido, é provável que a mente canina não perca tempo em avaliar a multitude de informações que recebe e tenha foco nos detalhes específicos e inequívocos de cada estímulo que determinam sua natureza. 

Portanto, quando o cão reage de uma forma estranha ou surpreendente, é importante refletir sobre o que está provocando esta reação. Para cães com medo e refratários a aproximações, a lista de possibilidades de estímulos aversivos é extensa: brilhos, sons metálicos, plásticos, solo que reflete a luz, sons agudos e especialmente, tudo que ele possa interpretar como um vazio, escadas, passarelas, pisos vitrificados, elevadores panorâmicos, paredes de vidro entre outros. Portanto, durante o treino e no cotidiano entender o que o cão está sentindo é importante para criar as menores contradições possíveis entre estratégias de manejo e a percepção do cão. 

Por outro lado, a habilidade de fazer associações tem um grande valor para o processo de aprendizagem. Isto porque cada animal rapidamente formará novas conexões e poderá ser mais flexível e adaptável ao seu ambiente físico e social. Fundamentalmente, a expectativa é de que a aquisição de novos padrões de comportamento lhe permita ser capaz de distinguir o que é inócuo do que é perigoso e modular sua reação.  

Ainda abordando a situação do medo, a menos que o funcionamento do sistema nervoso central esteja absolutamente alterado por emoções negativas, uma outra característica que também prepondera nos cães é a curiosidade. Utilizar técnicas extremamente motivadoras, permite que ele supere gradualmente suas dificuldades e possa estar mais atento e receptivo ao que está sendo ensinado.

Muitos métodos de mudança de comportamento dos cães estão disponíveis e têm eficácia; no entanto, o educador canino deve optar pelos que causam menos danos e produzem os melhores resultados a longo prazo.

 

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Referências: 1. Appleby, D.L., Bradshaw, J.W.S. & Casey, R.A. (2002). Relationship between aggressive and avoidance behaviour by dogs and their experience in the first six months of life. — Vet. Rec. 150: 434-438. 2. Tod, E., Brander, D., & Waran, N. (2005). Efficacy of dog appeasing pheromone in reducing stress and fear related behaviour in shelter dogs. Applied Animal Behaviour Science, 93(3–4), 295–308. 3. Wells, D. L. (2009). Sensory stimulation as environmental enrichment for captive animals: A review. Applied Animal Behaviour Science, 118(1–2), 1–11.