Ansiedade de separação

Profa. Dra. Ceres Berger Faraco – Especialista em Comportamento Animal 

 

Cães e os problemas relacionados com a separação

Demonstrar sensibilidade na separação do tutor é uma das principais evidências sobre a capacidade de apego dos cães. Na maior parte das vezes, as circunstâncias de separação provocam estresse moderado e que não afeta o seu bem-estar. Porém, também ocorrem casos com uma intensidade de estresse muito elevada e que podem gradativamente representar risco para o animal e para a manutenção do seu vínculo com a família. 

Atualmente, temos muito mais cães convivendo com as famílias e os distúrbios relacionados com separação são os problemas relatados com maior frequência. Nesses casos, foi verificado que os sinais relacionados ao estresse da separação incluem mais de 50 comportamentos variados, tais como: salivação, eliminações em locais inapropriados, destruição de objetos, vocalizações e tentativas de fuga, entre outros. 

O desafio dos profissionais que atuam em comportamento não é simples, devido a complexidade destes quadros. E, isso fica evidente, ao considerarmos que as manifestações podem ser opostas, já que alguns animais demonstram intensa atividade motora enquanto outros permanecem completamente inativos ao estarem sós. 

Os tutores envolvidos com este tipo de problema também são afetados, assim como outros animais que possam morar no mesmo local. Assim, temos uma situação que pode ser denominada como um ambiente potencialmente ¨tóxico¨. Este termo se refere ao local no qual o clima familiar e as relações se constituem em importante fonte de estresse.

 Cabe destacar que, o profissional além de buscar alternativas para o controle dos sinais que afetam o bem-estar animal, precisa ter atenção para os demais que convivem naquele lugar. Frequentemente, os protocolos para tratamento são de longa duração e demandam bastante tanto do especialista, quanto da família humana. Portanto, é indispensável adotar desde o início, recomendações que atenuem o impacto desta situação na vida de todos.

 

Um desafio complexo 

As orientações para o lidar com estes quadros devem contemplar alimentação adequada e enriquecida, interações entre as pessoas e animal de forma consistente e positiva, exercícios e atividades motivadoras diárias, enriquecimento sensorial olfatório por feromônios, desafios cognitivos e experiências sociais com outros cães sempre que for possível e pertinente para o caso. A relevância destas indicações se deve aos estudos que comprovam a relação entre comportamentos devidos à separação e as condições ambientais (física, social) que o animal está exposto. 

Com base em investigações recentes, pode-se afirmar que o estresse da separação está vinculado aos estados emocionais preponderantes no animal. Nesse sentido, deve ser ressaltado que não somente a ansiedade é responsável pelos comportamentos que ele demonstra ao ficar sozinho. E, essa, é uma nova abordagem para o problema. 

Por isto, foi necessário atualizar o uso do termo que era generalizado de ¨Ansiedade de Separação¨ para outra denominação mais genérica e que dá conta de outras motivações emocionais envolvidas nestes comportamentos, tais como o medo e comportamentos fóbicos. Atualmente, o quadro é denominado como “Problemas relacionados a Separação”. Desta forma, inclui outras motivações emocionais importantes como a frustração que provoca muitas vezes o aparecimento de condutas destrutivas. 

A frustração surge quando a expectativa que o animal tem não é atendida. Diferentes gatilhos podem desencadear esta condição e o animal apresentará elevada reatividade, latidos excessivos, aumento da atividade exploratória que evolui para comportamentos desorganizados e destruição de objetos. 

Em estudo sobre os distúrbios de separação em mais de 2000 cães, ficou evidenciado a combinação de fatores internos com comportamentos: frustração correlacionada com comportamentos destrutivos direcionados a portas e janelas e o aumento de frequência de latidos, enquanto a motivação por medo está conectada com vocalização caracterizada por choros ou choramingos. O comportamento inconsistente por parte do tutor, suas respostas imprevisíveis para as necessidades e expectativas do cão, tem por consequência um reduzido nível de tolerância a frustração nos cães com latidos frequentes, mas sem choros. Considerando o que foi dito, é preciso rever o que durante muito tempo foi considerado como o motivo das alterações comportamentais na separação, ou seja, o excesso de apego (hiperapego) do cão com o tutor. Nem todos os cães que têm hiperapego tem este problema e tampouco os cães sem hiperapego estão imunes aos problemas de separação.

Mas, a que se atribui os problemas de separação dos cães? As situações ligadas a emoções tanto negativas como as positivas conforme exemplificado a seguir:

 

Emoções positivas – animais que têm comportamentos muito intensos nas brincadeiras ou ao explorar o ambiente e os tutores não permitem pelo risco de estragar ou destruir coisas da casa. Resulta no animal executando os comportamentos potencialmente destrutivos quando está só.

 

Emoções negativas – o animal que não desenvolveu autonomia por ter sido adotado com menos de 45- 60 dias e não completou o processo de desapego materno e naqueles que sentem medo de tormentas, ruídos, fogos de artifício e relacionam estes eventos com o estar só na casa.

 

Em suma, os problemas relacionados a separação constituem um conjunto de sinais que requerem uma abordagem ampliada para compreender suas motivações e instituir os procedimentos mais adequados.

 

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Fontes: 1. de Assis LS, Matos R, Pike TW, Burman OHP, Mills DS. Developing Diagnostic Frameworks in Veterinary Behavioral Medicine: Disambiguating Separation Related Problems in Dogs. Front Vet Sci. 2020 Jan 17;6:499. 2. Konok, V; Marx, A.; Faragó, T. Attachment styles in dogs and their relationship with separation-related disorder – a questionnaire based clustering. Appl. Anim. Behav. Sci., 213 (2019), pp. 81-90, 3. McPeake KJ, Collins LM, Zulch H and Mills DS (2019) The Canine Frustration Questionnaire—Development of a New Psychometric Tool for Measuring Frustration in Domestic Dogs (Canis familiaris). Front. Vet. Sci. 6:152. doi: 10.3389/fvets.2019.00152 4. Ogata, N., 2016. Separation anxiety in dogs: what progress has been made in our understanding of the most common behavioral problems in dogs? J. Vet. Behav. 16,28–35.